Competição com agro brasileiro III
Indústria de máquinas e implementos agrícolas pode ser beneficiada
No governo Bolsonaro, a Embrapa apresentou tecnologias em agricultura tropical para embaixadores de 32 países africanos em evento promovido pelo Itamaraty em outubro de 2021.
O encontro propôs cooperação com vistas a disseminar o modelo do Brasil naquele continente.
A então ministra da Agricultura, Tereza Cristina, destacou à época que as tecnologias do Brasil poderiam, sim, impulsionar os sistemas produtivos da África.
E uma das maiores interessadas nessa iniciativa é a indústria brasileira de máquinas e implementos agrícolas, além dos exportadores de diversos gêneros agrícolas.
Pesquisadores têm se dedicado a responder se a África poderia se tornar concorrente do Brasil na exportação de soja, considerando o perfil do continente africano e a chance de a tecnologia da Embrapa ser usada na produção do grão.
Apesar de a produção de soja na África ser insuficiente para abastecer até mesmo a própria demanda, o continente tem extensa área com características de clima e solo semelhantes às do cerrado, o que poderia permitir que a região virasse grande produtor mediante tecnologia de agricultura tropical, da qual o Brasil é líder.
Mas, antes disso, ressalvam especialistas, os países da região precisariam resolver questões ambientais, sociais e de conflitos políticos para impulsionar a produção da oleaginosa.
Enquanto isso, há áreas no próprio território brasileiro capazes de serem integradas à produção.
Diferentemente da Europa e dos Estados Unidos, que não têm mais espaço para expandir fronteiras agrícolas, o país também a maior reserva de água doce do mundo, com 15% do total, o que sinaliza capacidade de aumentar a área irrigada.
As projeções para o agronegócio global são auspiciosas, por causa das perspectivas de aumento populacional global.
O cerrado brasileiro e a savana africana têm espaço físico para expandir a produção de alimentos.
Na visita que o ministro da Agricultura fez há duas semanas à China, ele buscou atrair investimento para recuperação e plantio de áreas degradadas para a agricultura.
A chinesa Cofco International já mostrou interesse e deverá enviar missão a Brasília no próximo mês para iniciar negociação.
O modelo da operação ainda será avaliado e uma possibilidade é envolver o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Larissa Wachholz, diretora da Vallya Agro, que se dedica à atração de capital chinês para o agronegócio brasileiro, acredita que o investimento do Brasil no potencial africano para exportar grãos traz mais oportunidades do que riscos.
O essencial é o país participar de forma pragmática e bem calculada dos espaços que serão abertos ao longo dos próximos 15 anos.
É melhor não ficar ausente desse processo que vai acontecer de toda forma, ficando a reboque de outros”, disse.
Ela lembra que, como grande produtor agrícola, a China também tem obtido avanços, com ganhos expressivos de produtividade, de até 4% ao ano.
É natural que a segunda maior economia e maior população do planeta, cerca de 20% do total, mas que detém só 8% das terras agriculturáveis e 5% dos recursos hídricos, se preocupe em diversificar seus fornecedores de alimentos.
Trata-se de um caminho sem volta, especialmente após os desarranjos sofridos pelo comércio internacional em razão da pandemia, o conflito comercial entre China e Estados Unidos e a guerra da Ucrânia, com impacto também no fornecimento de fertilizantes, explicou ela.
Por essa razão, a especialista – que acompanha de perto as transações entre Brasil e China há 15 anos e assessorou a ex-ministra da Agricultura e atual senadora Tereza Cristina (PP-MS)
– acredita que a África deve se tonar produtor de grãos, mas ainda tem de superar dificuldades fundiárias e de falta de conhecimento técnico e administrativo.
Nesse último ponto, o Brasil pode sair no lucro ao ajudar na capacitação africana.
Acho interessante o posicionamento estratégico do Brasil porque a Ásia como um todo tem na sua trajetória de crescimento econômico acelerado,
com ascensão de classes médias, a propensão de aumentar seu consumo de proteína animal, o que demanda maiores volumes de soja e milho para sua produção.
Trata-se de uma grande oportunidade e o Brasil deveria se firmar como uma liderança de vanguarda nesse processo, observou.
Outros especialistas avaliam que o Brasil precisa investir em mais acordos comerciais com outros países para escoar excedentes e com isso se precaver de um cenário provável em que a China venha a reduzir o ritmo de compra da soja brasileira.
Outra opção seria redirecionar a soja para alimentar rebanho nacional de carnes, item crescente da pauta exportadora e que tem de quatro a dez vezes mais valor agregado por tonelada do que a soja.
Por: Sílvio Ribas Brasília