Estilo : Comportamento

Cultura comportamental

A feira da troca

Andou mais um pouco e não acreditou em que seus olhos leram: “Aqui temos PAZ para todos os gostos! Não viva em conflito, adquira sem demora a sua PAZ!

Augusto acordou cedo naquele dia. Acreditava que tinha algo muito importante para fazer, algo que mudaria para sempre a sua vida e a situação de sua família, e esta era para Augusto o seu oxigênio, tudo de mais importante no mundo. Daria fácil, fácil a sua própria existência pelo bem-estar de sua esposa e filhos.

Tomou seu café, cheio de esperança, e disse à Laura, sua esposa:

“Meu anjo, hoje vamos mudar de vida!

Eu vou à feira da troca para trocarmos o que temos com fartura aqui em casa por aquilo que nos falta”. Laura ficou preocupada:

“Augusto, estou com muito receio dessa feira da troca,
não confio nos seus organizadores, eles não parecem dizer a verdade”.

Augusto achou graça:

“Não se preocupe, Laura, nos negócios ninguém fala a verdade, por isso é necessário ter muita
astúcia, e eu tenho de sobra, mas esta não trocarei”.

Laura ficou pensativa por um tempo e perguntou:

“O que pretende trocar? O que você acha que nos falta?

Eu não sinto falta de nada. Temos muito amor uns pelos outros aqui em casa, isso não basta?”

Augusto ficou orgulhoso de sua esposa:

“Sim! Somos felizes por termos tanto afeto uns
pelos outros, não é fácil de se conseguir isso em uma família. Porém, temos umas briguinhas
também, não temos muito conforto, trabalhamos demais… e veja: temos liberdade em abundância,
inclusive o excesso é tanto que temos liberdade até para as futuras gerações”.

Laura se assustou:

“Meu Deus, homem! A liberdade é o bem mais precioso que temos. Você acha que
é abundante, porque você nunca soube o que é perdê-la. Não! Por favor, não faça isso, não
troque a nossa liberdade por nada!”

Augusto perdeu um pouco de sua paciência: “Temos em
abundância, só vou trocar o excedente, não precisa fazer escândalo por conta disso!”

Depois dessa reação de Augusto, Laura se calou, não queria brigar, já que as “briguinhas” incomodavam
tanto seu marido.

E lá se foi Augusto, cheio de si, jurando que provaria à sua esposa, por A mais B, que ele
estava certo e ela, errada.

Chegou à primeira banca da feira da troca e pediu:

“Bom dia, meu
amigo, eu quero trocar um pouco da minha liberdade por essas facilidades todas que você tem aí.

Eu trabalho muito, entende?

Chegou a hora de ter um pouco de conforto e vida mansa. O dono da banca de facilidades o olhou com desprezo e respondeu:

“Não sou seu amigo, mas faremos bons negócios aqui.

Pode escolher as facilidades que quiser, mas o pagamento é à vista, nada de pendurar”.

E Augusto escolheu bastantes facilidades e pagou com uma parte de sua liberdade, mas
sua bolsa ainda estava cheia, e Augusto pensou:

“Nossa! Barato demais! Tantas facilidades por um pouquinho só de liberdade? Uma pechincha!”

Na próxima banca, Augusto ficou mais empolgado, pois estavam trocando ali ingressos para vários
tipos de grupos sociais, clubes… tribos – como dizem os jovens.

Augusto ficou encantado. Seus filhos seriam enturmados, cheios de amigos, cheios de festas e reuniões. Ele e sua família
teriam divertimentos sociais sem fim, com aceitação irrestrita.

Nunca tiveram isso, seria uma
surpresa maravilhosa para toda a família. Sem nem pensar muito no preço, Augusto fechou negócio
e esvaziou um pouco mais a sua bolsa.

Andou mais um pouco e não acreditou em que seus olhos leram:

“Aqui temos PAZ para todos os gostos! Não viva em conflito, adquira sem demora a sua PAZ!”

Augusto até tropeçou no meio-fio, de tão tonto que estava.

Chegou para o rapaz no balcão e falou emocionado:

“Eu entrego toda a liberdade que tenho pelo seu produto. Pode levar até a bolsa!”

O rapaz olhou desconfiado e perguntou:

“O senhor tem certeza? Depois não poderá voltar atrás no negócio. Não trabalhamos
com devoluções!”

Augusto nem escutou o aviso até o fim, entregou a bolsa e pegou a sua sonhada mercadoria.

Ao voltar para casa, Augusto começou a distribuir os presentes aos filhos e à esposa.

Seus filhos, ainda muito jovens, pularam de alegria.

Já sua esposa correu para seu quarto em desespero:

“Meu Deus, o que será de nós agora?”

Augusto foi atrás para consolá-la:

“Laura, mas o que é isso, meu anjo?    Não viu como ficaram as crianças?    Por favor, Laura, vamos comprar um
jantar bem gostoso e comemorar nossa felicidade, que será maior ainda a partir de hoje.

Eu vou agora mesmo ao restaurante, não precisa fazer nada. Não se preocupe mais com nada, Laura!”

Mal pôs o pé para fora de casa, e Augusto dá de cara com dois homens que o encararam com
impaciência:

“Aonde o senhor pensa que vai?” Assustado e surpreso, Augusto respondeu:

“Vou ao restaurante comprar um jantar para minha família”.

“Não vai a lugar algum! O senhor trocou a sua liberdade de locomoção por algumas facilidades, lembra? Se não lembra, estaremos sempre aqui para refrescar sua memória”.

Augusto voltou para dentro de casa, desanimado, mas não quis fazer alarde para não assustar sua
família, porém, Laura viu tudo e entendeu tudo.

Augusto, sem graça, inventou uma desculpa e disse que resolveu pedir pelo telefone, afinal para que servem as facilidades, não é mesmo?

Ligou para o restaurante e ouviu do outro lado da linha uma voz rouca e nada amigável:

“O senhor trocou a sua liberdade de escolha por aceitação social, lembra? Agora não tem poder
nenhum de comprar no restaurante de sua preferência. O senhor somente poderá comprar no
restaurante da Organização da Feira da Troca, e lá não há serviço de entrega”.

Augusto ainda tentou argumentar:

,“Mas eu não tenho mais liberdade de locomoção, não tenho como ir lá!” E a
voz respondeu: “Isso não é problema meu. O senhor deveria ter pensado muito bem antes de trocar
suas liberdades. Boa noite!”

Augusto já estava desesperado.

Como poderia viver deste jeito? O que fazer? A quem recorrer? Em sua angustia, correu para janela, para tentar pedir ajuda aos seus vizinhos e gritou: “Socorro!
Preciso de ajuda!

Minha família precisa de ajuda ou morreremos de fome!

Eu fui à feira da troca hoje e fiz alguns negócios, mas estou arrependido!

Fui enganado! Por favor, chamem a polícia!

Eu não posso sair de casa!

Por favor, alguém me ajude! Nesse momento um carro para na porta da casa de Augusto, e dois homens

mal encarados se aproximam, e um deles chuta a porta, que se abre sem muita resistência.

“O senhor está preso!”, anuncia um dos homens. Augusto se esforça
para continuar de pé:

“Preso? Mas o que foi que eu fiz?”

O homem olhou para seu colega com ar de deboche:

“Eles sempre são inocentes, não é?”

O colega riu e se virou para Augusto:

“O senhor falou mal da Organização da Feira da Troca, e isso é crime gravíssimo, punível até mesmo com a
pena máxima: a morte”.

Augusto não aguentou:

“E a minha liberdade de expressão? Onde fica?” O
seu algoz retrucou: “Ficou na feira da troca, o senhor a entregou pela paz”.

By: Romana Castro

Link original da matéria:
https://agoranoticiasbrasil.com.br/a-feira-da-troca/  

E a minha liberdade de expressão? Onde fica?” O seu algoz retrucou: “Ficou na feira da troca, o senhor a entregou pela paz”.
  • Fonte da informação:
  • Leia na fonte original da informação
  • Gildo Ribeiro

    Gildo Ribeiro é editor do Grupo 7 de Comunicação, liderado pelo Portal 7 Minutos, uma plataforma de notícias online.

    Artigos relacionados

    Verifique também
    Fechar
    Botão Voltar ao topo