Linhas De Tansmissão De Energia
Entenda Possíveis Causas Do Apagão e a Reação Do Sistema Elétrico.
Governo diz que combinação de 2 ocorrências provocou queda; a 1ª delas, uma sobrecarga em linhas de transmissão do Ceará.

O apagão nacional que deixou 25 Estados e o Distrito Federal sem energia na 3ª feira (15.ago.2023) foi causado por 2 problemas, ao que tudo indica. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que a 1ª razão foi uma sobrecarga em linhas de transmissão no Ceará, mas não detalhou o que teria provocado isso. O outro motivo ainda é desconhecido. Só se sabe que também foi uma intercorrência nas regiões Nordeste e Norte.
Especialistas ouvidos pelo Poder360 listaram possíveis motivos que podem ter provocado a pane. Uma das principais hipóteses apontadas é que uma abrupta mudança no fluxo da geração de usinas eólicas e solares tenha feito o sistema cair por injetar mais energia que a capacidade das linhas de transmissão. O governo não descartou a possibilidade, mas há outros fatores.
Ainda não há nenhuma conclusão, mas os analistas e o próprio governo acreditam que dificilmente seria um único problema. O ONS (Operador Nacional do Sistema) divulgará um relatório detalhado com as causas em até 48 horas. A Polícia Federal e Abin (Agência Brasileira de Inteligência) também vão investigar se houve ação criminosa.
Entenda abaixo o que se sabe:
COMBINAÇÃO DE FATORES Silveira classificou o apagão como um evento raro e uma combinação de pelo menos 2 problemas. Explicou que o sistema elétrico brasileiro trabalha com o modelo de segurança “N–1”, com duplicidade ou redundância na operação. “Para acontecer alguma coisa, teria que ter 2 eventos [falhas] concomitantes”, disse.
Nas comparações do próprio ministro, esse modelo funciona como 2 estradas independentes, mas na mesma direção. Se uma apresentar problemas e ficar obstruída, há outra que pode substituí-la. Isso é necessário porque problemas nas linhas de transmissão podem ocorrer com frequência.
SOBRECARGA NO CEARÁ
A 1ª causa identificada foi a sobrecarga em linhas de transmissão no Ceará. Os números do ONS (Operador Nacional do Sistema), responsável pelo SIN (Sistema Elétrico Nacional), mostram que a carga no subsistema Nordeste estava em 11.848 MW às 8h30. Houve pico de carga logo depois, alcançando 17.648 MW às 8h31.
Essa sobrecarga fez o subsistema cair automaticamente. A carga na região atingiu 6.542 MW às 8h40. Só foi normalizada por volta de 14h42.
“Houve uma elevação muito grande de geração no subsistema Norte e Nordeste. Foi injetada nas linhas de transmissão de lá uma carga de energia acima da capacidade e com isso o sistema desarmou, provocando um desequilíbrio de carga. E as outras regiões foram afetadas por intervenção do ONS, desligando as gerações para que esse problema que ocorreu, que foi grave, não se propagasse ao longo do sistema interligado nacional”, explica Luciano Duque, engenheiro eletricista e professor do Ceub (Centro Universitário de Brasília).
GERAÇÃO EÓLICA E SOLAR
O fluxo da geração de energia em usinas eólicas e solares no Nordeste do país pode ser a causa da sobrecarga. No momento que houve a ocorrência, havia mais energia de usinas eólicas e solares entrando na rede do Nordeste do que proveniente de térmicas e hidrelétricas. Números do ONS mostram que a região concentra a maior parte da produção nessas fontes, que respondem por 70% do subsistema.
Adriano Pires, diretor-fundador do Cbie (Centro Brasileiro de Infraestrutura), diz que como as fontes eólicas e solares são intermitentes, não trazem segurança de um fornecimento de energia contínuo. Assim, essas usinas podem não gerar nada em momentos de pouco vento e falta de sol, mas podem apresentar picos de geração em alguns momentos do dia.
O sistema elétrico atual, porém, não suporta os trancos causados por essa intermitência. Alexandre Silveira admitiu que o sistema precisa ser aperfeiçoado para se adaptar a essas fontes. “Energias limpas e renováveis são uma realidade. Eólica é uma realidade, solar é uma realidade, e elas são um caminho sem volta. O sistema tem que cada vez mais se modernizar para que possa convergir as energias estáveis”, disse o ministro.
Segundo Luciano Duque, essa é uma das principais possibilidades para a pane. “Quando a energia vem de hidrelétrica ou térmica, ela produz continuamente. No solar e eólica, não é contínua. Alguma fonte dessas, por algum problema ou alguma questão de geração, injetou muita carga no sistema. E o sistema entende isso como uma anomalia, por não estar preparado para isso, e desarma”.
OUTRAS HIPÓTESES
Luciano Duque cita outras causas possíveis que podem ter provocado esse pico de energia no Ceará, como uma descarga atmosférica na rede ou curto-circuito em uma fonte geradora.
A 2ª causa, também por problema nos subsistemas Norte e Nordeste, pode ter sido causada por falhas nos sistemas de proteção e de geração, ou mesmo erros humanos.
Há possibilidade inclusive de ação criminosa, como, por exemplo, sabotagem em linha de transmissão, hipótese que também vem sendo considerada pelo governo.
POR QUE RORAIMA NÃO FOI AFETADA
Roraima é a única unidade da Federação que não está conectada ao sistema nacional de energia. Comunidades indígenas impedem que seja construído um linhão de transmissão do Amazonas até Boa Vista.
O Estado usa sobretudo energia termelétrica gerada localmente, operadas pela empresa Roraima Energia.
Por mais de 18 anos, a energia de Roraima foi fornecida pela Venezuela. A ligação entre a capital, Boa Vista, e o complexo hidrelétrico de Guri, em Puerto Ordaz, era feita pelo Linhão de Guri.
Em março de 2019, o país venezuelano parou de enviar energia ao Estado por causa de uma crise energética enfrentada pelo país e desentendimentos de Nicolás Maduro com a gestão de Jair Bolsonaro (PL). Desde então, a energia elétrica consumida pelos 15 municípios de Roraima é fornecida pela Roraima Energia e casos de apagões foram registrados no Estado.
Em 4 de agosto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assinou decreto autorizando o Brasil voltar a importar energia elétrica da Venezuela. O objetivo é comprar energia produzida na hidrelétrica venezuelana de Guri para abastecer o Estado de Roraima.
O decreto foi assinado em Parintins (AM), durante cerimônia de relançamento do Luz Para Todos e do programa de descarbonização da Amazônia. Dentre as obras previstas, está o Linhão de Tucuruí, que vai interligar Boa Vista (RR) ao SIN. No entanto, a obra de R$ 2,6 bilhões, só deve ser concluída em 2025.