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' O Efeito Trump':

Empresas americanas se rendem à agenda conservadora e abandonam metas de diversidade e ESG

Das big techs aos setores tradicionais, companhias adaptam práticas ao novo cenário político. Walmart, Amazon e Boeing estão entre elas

Em menos de dez dias, Donald Trump voltará a ocupar o Salão Oval da Casa Branca.

Mas, antes disso, o setor corporativo já dá sinais de que está preparado para os novos tempos.

Em uma mesma semana, Mark Zuckerberg anunciou que a Meta — dona de Facebook e Instagram — deixará de usar programas de checagem independente de informação, um pilar do combate a fake news; o McDonald’s encerrou seus programas de inclusão e diversidade; e a megagestora de ativos BlackRock abandonou um importante grupo climático, em mais um sinal de recuo ambiental em Wall Street.

Desde o avanço da onda conservadora nos EUA, que tomou corpo no ano passado e culminou na vitória eleitoral do republicano, especialistas avaliam que o ambiente corporativo americano está esvaziando a agenda progressista e identitária.

O movimento de debandada ganha novos adeptos a cada etapa da peregrinação de CEOs a Mar-a-Lago, na Flórida, para jantares com Trump em seu resort de luxo.

Esse afã por adotar políticas alinhadas ao presidente eleito — que abrange desde empresas de segmentos tradicionais até big techs, de nomes do Vale do Silício a Wall Street — foi diagnosticado pelo próprio Trump, que, no último dia 19 de dezembro, escreveu na rede Truth Social:

Todo mundo quer ser meu amigo.

As chamadas políticas de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) têm perdido adeptos.

Na sexta-feira, segundo a Bloomberg, a Meta recuou de uma série de políticas nessas áreas e informou aos funcionários que eles não serão mais obrigados a entrevistar candidatos de grupos sub-representados para vagas abertas ou a buscar negócios com fornecedores diversificados.

Na mesma semana, Zuckerberg já havia anunciado o fim das restrições a conteúdos considerados  culturais e políticos.

Em diretriz da empresa, não serão coibidas publicações que associem, por exemplo, “doenças mentais” ao gênero ou orientação sexual, especialmente quando discutidas no contexto de debates religiosos ou políticos.

O movimento não começou agora.

Em novembro, o Walmart anunciou que não usará mais parâmetros de raça e gênero para selecionar contratos de fornecimento e reduziu treinamentos sobre equidade racial.

A Boeing desmantelou seu departamento de DEI, que foi integrado a outro setor, segundo a Bloomberg.

Já a Harley Davidson eliminou sua divisão de DEI em abril passado, além de abandonar metas de gastos com empresas fornecedoras lideradas por minorias e reduzir treinamentos sobre temas sociais.

Maior varejista on-line do mundo, a Amazon também passou a adotar nova abordagem que limita suas políticas de diversidade. Em memorando interno de dezembro, a companhia anunciou o encerramento de programas considerados desatualizados, como parte de uma ampla revisão de suas iniciativas.

Mudança de valores
Enquanto parte do setor corporativo partiu para uma corrida desabalada de alinhamento de práticas e políticas com o presidente que assume no dia 20, houve quem decidisse até apoiar financeiramente a posse de Trump.

A Toyota, por exemplo, anunciou doação de US$ 1 milhão para a cerimônia.

A Uber e seu CEO, Dara Khosrowshahi, contribuíram com o mesmo valor.

Nesta semana, a Bloomberg revelou que Microsoft, Google e Adobe doaram individualmente US$ 1 milhão para o fundo da posse, somando-se a nomes como Amazon, Meta e OpenAI.

A virada de chave dos CEOs em relação a uma postura adotada recentemente — especialmente após a invasão ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, quando várias empresas interromperam doações a parlamentares republicanos — surpreendeu o próprio Trump.

Na semana passada, a repórteres, ele atribuiu essa guinada de percepção dos executivos à “votação popular” e ao desejo de “fazer algo acontecer”. E rapidamente passou a listar os últimos convivas:

“Jeff Bezos veio. Bill Gates veio. Mark Zuckerbeg veio”. E acrescentou: “E ninguém disse nada de ruim sobre mim. Não estou acostumado”.

O professor da UFRJ Michel Gherman menciona mudanças políticas que explicam esse redirecionamento: a ideia de que a regulamentação reduz lucros imediatos e o impacto do identitarismo nas finanças das empresas.

Ele diz que o mapa eleitoral americano mudou, revelando um novo comportamento de eleitores e consumidores. Alguns estados tradicionalmente democratas, como a Califórnia, passaram a ter focos republicanos em 2024.

— Essas empresas veem a regulamentação como negativa, assim como aconteceu com a indústria de cigarro no século XX e das armas no século XXI.

Há também um novo momento, em que pessoas brancas e empobrecidas se sentem ameaçadas pelo identitarismo.

Segundo o especialista, a agenda do presidente Joe Biden, que buscou aumentar a capacidade financeira do Estado e promover uma economia de bem-estar social, influenciou a mudança de opinião dos empresários.

Em outubro, o The Washington Post anunciou que não apoiaria qualquer candidato em 2024 ou em futuras disputas após veto do proprietário, o empresário Jeff Bezos, fundador da Amazon. O jornal já havia preparado um editorial em apoio à vice-presidente Kamala Harris, a rival democrata de Trump.

No radar do empresariado estão expectativas de menos regulamentações e impostos em um novo governo Trump.

Guilherme Casarões, cientista político e professor da FGV/EAESP, diz que as empresas de tecnologia, sobretudo as big techs, buscam manter seu protagonismo, dado que o empresário Elon Musk, dono do X e da Tesla, foi apoiador de primeira hora de Trump e será figura central no governo.

Pedro Abramovay, vice-presidente da Open Society Foundations, também aponta que Musk tornou mais palatável a aproximação das big techs com o trumpismo.

Essas empresas sempre estiveram atreladas a valores progressistas, mas foram acusadas de favorecer a eleição de Trump em 2016 devido à ampla disseminação de discursos de ódio nas redes.

Em resposta, revisaram políticas internas.

— E o governo Biden teve uma postura muito agressiva contra monopólios e oligopólios de empresas do Vale do Silício.

Existe um interesse econômico ameaçado.

Mesmo assim, era difícil para eles conciliarem o tipo de cultura que estabeleceram com a aproximação de Trump, e Musk consegue fazer essa virada.

Financiamento climático

Se antes o setor corporativo americano não via como essencial cair nas graças do governante da ocasião para conduzir os negócios, a chegada de Trump à Casa Branca mudou essa mentalidade, avalia Casarões:

— As empresas não viam a necessidade do alinhamento com Trump porque o mercado poderia se regular independentemente de quem estivesse no poder.

Isso muda após o primeiro mandato, em que Trump favorece algumas empresas e setores de maneira mais aberta.

Reportagem nesta semana do Wall Street Journal mostra que executivos menos versados na linguagem do trumpismo têm recorrido ao aconselhamento da ex-governadora da Carolina do Sul Nikki Haley, que desafiou Trump nas primárias do Partido Republicano e foi sua embaixadora no primeiro mandato.

Aos ouvintes, a recomendação é seguir a “abordagem Dolly Parton”, em referência à famosa cantora de música country americana.

Ela raramente expressa opiniões políticas, embora apoie a causa LGBTQ+ e a pesquisa para vacina da Covid-19.

Todo mundo ama a Dolly Parton, mas ninguém sabe o que ela defende, afirmou a ex-governadora de acordo com o jornal.

Lições de etiqueta e abordagem à parte, não é só na pauta de costumes e representatividade que o setor corporativo está mudando de direção.

O financiamento climático tem visto uma saída de cena pela direita.

Em dezembro, Citigroup e Bank of America deixaram a Net-Zero Banking Alliance (NZBA), programa de redução de emissões, seguindo os passos do Goldman Sachs e do Wells Fargo.

A BlackRock também anunciou sua saída da Net Zero Asset Managers nesta semana, enquanto legisladores republicanos pressionam pelo distanciamento de grupos que combatem as mudanças climáticas.

— Esse recuo das grandes empresas é na verdade uma adesão à linguagem negacionista— avalia Gherman.

Por Ana Flávia Pilar — São Paulo

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  • Gildo Ribeiro

    Gildo Ribeiro é editor do Grupo 7 de Comunicação, liderado pelo Portal 7 Minutos, uma plataforma de notícias online.

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