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Esquerdismo em desencanto

Esquerda tem a menor votação do século, perdida em mato sem cachorro

Declínio começou em 2016, com choques políticos e econômicos e mudança social e cultural

Nesta eleição de 2024, a esquerda teve a menor votação para prefeito deste século, a menor pelo menos depois de 1996.

Por esquerda entendem-se aqui PT, PSOL, PC do B e partidos que estiveram, não raro, associados de alguma forma ao PT, como PSB, PDT, PV e Rede.

Não se recorreu a um “esquerdômetro” para classificar as legendas.

Trata-se de partidos que podem ser chamados de “comunistas” por pastores furibundos e outras lideranças estridentes e militantes digitais da direita.

Na eleição de 2000, os candidatos a prefeito da esquerda tiveram 26,6% do total dos votos.

Essa proporção foi a 37,4% em 2012.

Minguou para 27,2% em 2016, desidratação devida à queda dos votos no PT.

A míngua continuou até os 19,6% deste ano.

Além da ascensão das direitas, houve também direitização profunda dos partidos desse espectro e daquilo que, por comodidade ou geografia espectral, se chama de centro.

O PSD, o vitorioso desta eleição, tenta ocupar a vaga ociosa do centro e até recolhe espólios do PSDB (o centro que o PT chamava de direita). A julgar pelas lideranças, o PSD parece um PFL algo mais ameno.

A direita agora se orgulha de dizer seu nome, explicita programas ditos conservadores; associa-se de corpo, alma e bolso a nomes como Jair Bolsonaro (PL).

De resto, para muito eleitor, esquerda passou a ser anátema. Além da “polarização”, mais circunstancial, grandes mudanças culturais, sociais e econômicas parecem ter criado eleitorado mais ideológico, por assim dizer.

Note-se que os números acima se referem à proporção de votos, não de candidatos eleitos. A tendência para o número de prefeituras conquistadas é a mesma, embora a proporção de prefeitos seja menor.

A esquerda, o PT em particular, tinha grandes votações em grandes cidades, como São Paulo, onde, claro, poderia eleger apenas um nome.

Em 2000, a esquerda elegeu 11% dos prefeitos. No pico de 2012, 27,2%. Agora, deve ficar com menos de 14%.

Em 2004, 2008 e 2012, o PT teve quase 17% do total nacional dos votos para prefeito. Os demais partidos de esquerda cresceram mais, nestes anos. Neste 2024, o PT teve 7,8%, ligeira recuperação do fundo do poço de 2016 (6,6%).

A tendência do total de votos da esquerda nas eleições para deputado federal é também a mesma, embora a baixa tenha sido bem menos pronunciada: 21,2% dos votos em 1998, pico de 36,6% em 2010 e 25,5% em 2022.

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deixou o poder em 2010 com cerca de 80% de nota “ótimo/bom” nas pesquisas.

Pouco antes do Junho de 2013, Dilma Rousseff tinha mais de 60% de nota máxima, recorde-se.

A Lava Jato, a campanha pela deposição de Dilma e a Grande Recessão (2014-2016) são marcas do começo da queda esquerdista.

A disseminação de internet e mídias sociais, especialidade da ultradireita, e a nova classe média que ascendeu sob Lula ajudaram a formar um novo espírito antiesquerdista, que tomou parte da crescente, mas minoritária, população evangélica também (mas não só).

Até o sucesso econômico e cultural do agro e o poder de novas elites econômicas do comércio e dos serviços devem ter pingado nesse caldo.

Com escassas novas lideranças, sem mote novo, alheia aos espíritos do tempo, com capilaridade ainda menor no Brasil profundo dos centrões, estigmatizada, sem novas articulações, bases ou redes sociais, a esquerda está em um mato sem cachorro.

Sobra Lula.

Por Vinicius Torres Freire

Link original da matéria:
FOLHA DE SÃO PAULO

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  • Gildo Ribeiro

    Gildo Ribeiro é editor do Grupo 7 de Comunicação, liderado pelo Portal 7 Minutos, uma plataforma de notícias online.

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