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Ex-chefe do Exército minimiza minuta golpista de Bolsonaro, confronta versões e leva bronca de Moraes

Freire Gomes confirma episódios da trama, mas em tom mais brando que o da denúncia; 'se mentiu para a PF, tem que dizer', diz ministro do STF a general

Ex-comandante do Exército, o general Marco Antônio Freire Gomes deu pela primeira vez publicamente sua versão sobre a trama golpista que se desenrolou no governo de Jair Bolsonaro (PL).

Em pouco mais de duas horas, em depoimento ao STF (Supremo Tribunal Federal) nesta segunda-feira (19), o general minimizou o conteúdo de uma das versões da minuta golpista apresentada, confrontou versões que foram apresentadas ao longo dos últimos meses e tomou bronca do ministro Alexandre de Moraes, que sugeriu que o militar estaria mentindo.

 

Ele também confirmou episódios decisivos da articulação da trama.

A investigação da Polícia Federal e a denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) apresentaram nos últimos meses Freire Gomes como um personagem essencial para os planos golpistas não terem ido em frente.

No depoimento desta segunda, ele deu uma versão mais branda do que aquela interpretada pelos investigadores.

Nesta segunda-feira, o general disse ao Supremo que foi convocado por Bolsonaro para participar de uma reunião no Palácio da Alvorada em 7 de dezembro de 2022. Foi nesse encontro que o ex-presidente apresentou aos chefes militares, pela primeira vez, a minuta de decreto golpista.

Segundo Freire Gomes, o texto apresentava uma série de considerandos como fundamentação jurídica para o golpe e sugeria o uso das Forças Armadas em medidas como GLO (Garantia da Lei e da Ordem), estado de defesa ou estado de sítio após o resultado eleitoral.

O objetivo seria intervir no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), então sob o comando de Moraes, anular o resultado das eleições e evitar a posse de Lula (PT), que acabara de ser eleito. Freire Gomes disse que essa primeira versão do documento não causou espanto nos chefes militares.

Ele apresentou esses considerandos, todos eles embasados em aspectos jurídicos, dentro da Constituição.

Não nos causou espécie.

Como ainda ia ser estudado e aprofundado, nós aguardamos uma outra manifestação do senhor presidente, afirmou.

O general disse que se reuniu com Bolsonaro em outras oportunidades no fim de 2022. Em um desses encontros o assunto foi retomado. Freire Gomes disse que foi nessa oportunidade que ele manifestou contrariedade a uma possível ruptura democrática.

 

Pelo que me lembro, ele apenas comentou o estudo [para o golpe].

O brigadeiro Baptista Júnior [ex-chefe da Aeronáutica] falou que não faria qualquer coisa e eu informei ao presidente,

de forma bastante cordial, que as medidas que ele quisesse tomar deveriam considerar vários aspectos:

o apoio internacional e nacional, o Congresso, a parte jurídica.

Freire Gomes negou que tenha dado voz de prisão a Bolsonaro.

A versão do general contraria o depoimento do brigadeiro Baptista Júnior,

que afirmou à Polícia Federal que o chefe do Exército teria dito que seria obrigado a prender o ex-presidente caso avançasse com os intentos golpistas.

O general diz que somente indicou a Bolsonaro que ele poderia ser enquadrado juridicamente caso adotasse uma medida ilegal.

E que o Exército não iria atuar em algo que iria extrapolar nossa competência constitucional.

Freire Gomes ainda afirmou que não poderia interpretar o que o ex-chefe da Marinha almirante Almir Garnier —réu no processo do golpe de Estado— queria dizer ao anunciar a Bolsonaro que apoiaria a medida que tomaria.

O almirante Garnier tomou a postura dele, acho que também foi surpreendido [com a minuta], e se manifestou.

Não interpretei como qualquer tipo de conluio, disse o general.

Moraes interrompeu o depoimento nesse momento e acusou o general de mentir em juízo.

A testemunha não pode omitir o que sabe.

Vou dar uma chance para a testemunha falar a verdade.

Se mentiu para a Polícia Federal, tem que dizer que mentiu para a polícia, disse.

O general respondeu que, após 50 anos de Exército, jamais mentiria.

O almirante Garnier tomou a postura de ficar com o presidente.

Não posso inferir o que ele quis dizer estar com o presidente.

Eu sei exatamente o que falei e afirmo:

ele disse que estava com o presidente, e a intenção do que ele quis dizer com isso não me cabe [interpretar].

O depoimento do general Freire Gomes era um dos mais aguardados entre as mais de 80 testemunhas indicadas para depor no processo da trama golpista.

Seria a primeira vez que o ex-chefe do Exército se apresentaria publicamente para contar o que vivenciou no fim de 2022.

A audiência, por videoconferência, reuniu os ministros Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano Zanin e o procurador-geral Paulo Gonet —presenças pouco comuns em sessões do tipo.

Os depoimentos ainda foram acompanhados por Bolsonaro e o ex-ministro Braga Netto.

A versão mais amena apresentada pelo general sobre as conversas com Bolsonaro e sobre sua reação às abordagens golpistas acabou sendo usada pelas defesas dos réus —em especial do ex-presidente— para levantar dúvidas sobre a denúncia.

A audiência desta segunda marcou o início da fase de depoimentos da trama golpista.

O Supremo vai dedicar duas semanas para ouvir as mais de 80 testemunhas indicadas pela acusação e pelas defesas do núcleo central da trama golpista.

Além do ex-presidente Jair Bolsonaro, o grupo tem como réus

Alexandre Ramagem (deputado federal e ex-chefe da Abin),

Almir Garnier (ex-comandante da Marinha),

Anderson Torres (ex-ministro da Justiça),

Augusto Heleno (ex-ministro do GSI),

Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro),

Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e

Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa).

Eles são acusados pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado. Somadas, as penas máximas podem passar de 40 anos de prisão.

O STF definiu que jornalistas credenciados e advogados das partes podem acompanhar os depoimentos no plenário da Primeira Turma do STF.

As audiências, por videoconferência, serão transmitidas nos telões do colegiado.

A imprensa, porém, está impedida de fazer gravações de áudio e vídeo das sessões.

O Supremo diz que a proibição tem como base o artigo 210 do Código de Processo Penal, que diz que as testemunhas serão inquiridas cada uma por vez

de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras.

O primeiro dia de depoimentos contou com quatro testemunhas:

Marcos Antônio Freire Gomes (ex-comandante do Exército),

Clebson Ferreira de Paula Vieira (ex-integrante do Ministério da Justiça),

Adiel Pereira Alcântara (ex-coordenador da PRF) e

Éder Lindsay Magalhães Balbino (dono de empresa contratada pelo PL para fiscalizar o processo eleitoral).

O ex-comandante da Aeronáutica brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Júnior teve o depoimento adiado para quarta-feira (21).

Ele está em viagem, fora do país.

Crises e ilações
Na Presidência, Bolsonaro acumulou uma série de declarações golpistas às claras, provocou crises entre os Poderes, colocou em xeque a realização das eleições de 2022, ameaçou não cumprir decisões do STF e estimulou com mentiras e ilações uma campanha para desacreditar o sistema eleitoral do país.

Após a derrota para Lula, incentivou a criação e a manutenção dos acampamentos golpistas que se alastraram pelo país e deram origem aos ataques do 8 de Janeiro.

Nesse mesmo período, adotou conduta que contribuiu para manter seus apoiadores esperançosos de que permaneceria no poder e, como ele mesmo admitiu publicamente, reuniu-se com militares e assessores próximos para discutir formas de intervir no TSE e anular as eleições.

Saudosista da ditadura militar (1964-1985) e de seus métodos antidemocráticos e de tortura, o ex-presidente já foi condenado pelo TSE por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é réu no STF sob a acusação de ter liderado a trama golpista de 2022. Hoje está inelegível ao menos até 2030.

Caso seja condenado pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado, a pena pode passar de 40 anos de prisão.

 

Por: Cézar Feitoza e Ana Pompeu

Link original da matéria:

FOLHA DE SÃO PAULO

 

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Moraes interrompeu o depoimento nesse momento e acusou o general de mentir em juízo.
A testemunha não pode omitir o que sabe.

 

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  • Gildo Ribeiro

    Gildo Ribeiro é editor do Grupo 7 de Comunicação, liderado pelo Portal 7 Minutos, uma plataforma de notícias online.

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