Quase dez anos após a morte
Do radialista Valério Luiz, filho espera a condenação dos réus:
‘O que exterminaram tem valor . Após três adiamentos, promotora também espera que julgamento aconteça: ‘Morreu porque era jornalista’. Juri popular está marcado para esta segunda-feira.
Quase dez anos após a morte do radialista Valério Luiz, o filho dele relembrou quando viu o pai baleado.
Em entrevista ao Fantástico,
Valério Luiz Filho falou que ainda espera a condenação dos réus. Um júri popular está marcado para segunda-feira (13), em Goiânia.
“A justiça precisa acontecer para esse caso, porque essa é a única forma de fazê-los sentir que o que eles exterminaram tem valor, que a vida do meu pai tinha valor, que o trabalho dele tinha valor”, disse o filho.
Após três adiamentos, a promotora Renata de Oliveira Marinho Souza disse que espera que o julgamento dos acusados de matar Valério Luiz aconteça.
“Ele não morreu por nada particular, assim, de uma briga no bar. Ele não morreu por questões meramente pessoais. Ele morreu porque ele era um jornalista”, acredita a promotora.
Valério Luiz
foi morto a tiros, aos 49 anos, quando saía da rádio em que trabalhava, no dia 5 de julho de 2012. Segundo a denúncia feita pelo Ministério Público, o crime foi motivado pelas críticas constantes de Valério Luiz à diretoria do Atlético Goianiense, da qual Maurício Sampaio, um dos réus, era vice-diretor. Atualmente, ele é vice-presidente do Conselho de Administração.
Os cinco acusados do crime são:
Maurício Sampaio, apontado como mandante;
Urbano de Carvalho Malta, acusado de contratar o policial militar Ademá Figueiredo para cometer o homicídio contra o radialista;
Ademá Figueiredo Aguiar Filho, apontado como autor dos disparos que mataram Valério;
Marcus Vinícius Pereira Xavier, que teria ajudado os demais a planejar o homicídio do radialista;
Djalma Gomes da Silva, que teria ajudado no planejamento do assassinato e também atrapalhado as investigações.
Filho relembra dia da morte
O crime aconteceu por volta das 14h. No dia, Valério Luiz Filho estava na casa onde o pai morava. Ele lembra que recebeu uma ligação da madrasta, às 14h22, falando que o radialista tinha levado um tiro.
“Eu lembro de eu pensar: ‘Meu pai está um pouco atrasado’. Nessa hora, a luz do celular ficou azul. Na ligação, eu atendi e era a minha madrasta falando: ‘Valério, vem aqui para porta da rádio, pelo amor de Deus (chorando). Seu pai tomou um tiro’. E desligou o telefone”, completou.
Quando Valério Luiz Filho
foi para a porta da rádio, ele lembra que havia muita gente no local e foi difícil se aproximar de carro. Ele teve que descer do veículo e continuar o trajeto a pé. Quando ele chegou, ele viu o carro do pai cheio de tiros e ele morto dentro do veículo.
“Meu pai estava dentro do carro ainda morto, o carro na diagonal, as portas abertas. Os vidros todos crivados de balas”, disse.
Coincidentemente,
o pai de Valério Luiz, o também cronista esportivo Manoel de Oliveira, que era conhecido como Mané de Oliveira, tinha um programa de TV no mesmo horário do filho e correu para a cena do crime.
“Quando meu avô chegou, ele avançou para tentar ir no carro. Foi uma cena terrível”, contou o neto.
Críticas ao Atlético
Valério Luiz tinha dois empregos: era comentarista em um programa de esportes da TV Puc e também trabalhava em uma rádio. Ele era polêmico e não media as palavras quando as críticas eram contra o time do coração, Atlético Goianiense.
“Negociatas no meio da noite. É uma entrevista imperdível”,
disse Valério Luiz durante um dos seus programas.
O filho
dele conta que, no primeiro semestre de 2012, o time goiano estava na lanterna do Campeonato Brasileiro e que tinha perdido o Campeonato Goiano para o Goiás Esporte Clube – fatos que, segundo ele, estavam gerando uma crise no time.
“Estava gerando uma crise na diretoria. Foi nesse contexto que meu pai estava desferindo suas críticas na época. Maurício Sampaio era vice-presidente do clube. Meu pai acreditava nisso que essa má fase do Atlético dava responsabilidade aos dirigentes, né? Principalmente ao Maurício”, contou.
Durante essa crise
no Atlético, Valério Luiz fez o seguinte comentário: “Meu amigo, você pode olhar em filme de aventura, quando o barco está enchendo de água, os ratos são os primeiros a pular fora”.
Dois dias depois desse comentário, o clube proibiu a entrada de todos os jornalistas que trabalhavam com o radialista e disse ainda que ele era “persona non grata”.
A proibição foi anunciada em uma carta, assinada pelo presidente do clube e por Maurício Sampaio.
“Enviaram uma carta para as emissoras. Isso abertamente. Às vezes, acontece de times proibirem equipes de entrar nas suas dependências, mas essa foi a primeira vez em que eles citaram expressamente o nome do jornalista”, disse o filho.
Duas semanas depois da carta, Valério Luiz foi assassinado quando saia da radio.
Investigação
A Polícia Civil concluiu, em fevereiro de 2013, que cinco pessoas participaram do crime. O inquérito possui mais de 500 páginas e mais um volume com provas técnicas contra os suspeitos.
O Ministério Público denunciou Maurício Sampaio como mandante do crime. O documento destacava que os comentários feitos por Valério Luiz geraram entre Sampaio e o radialista “acirrada animosidade e ressentimento” por parte do acusado.
Segundo as investigações,
ele teria encomendado a morte do jornalista para dois policiais militares – que faziam informalmente a segurança dele: sargento Djalma da Silva e o cabo Adema Figueiredo.
O esquema também teria contado com a ajuda de uma espécie de faz tudo do dirigente, Urbano Malta, e de um informante da polícia: Marcus Vinícius Pereira Xavier.
Para o Ministério Público,
a peça-chave desse esquema é Marcus Vinícius, que chegou a prestar quatro depoimentos diferentes. Depois de solto, foi para Portugal sem informar a justiça. Entrou na lista dos mais procurados da Interpol. Foi preso e extraditado em 2014. Aqui no Brasil, ele deu um novo depoimento a justiça.
Marcus Vinicius tinha um açougue, que vendia espetinhos. Segundo ele, a ação foi planejada ali, pelo sargento Djalma da Silva, que frequentava o local e é apontado como articulador do crime.
A tarefa de Marcus Vinicius,
segundo a polícia, foi arrumar uma moto, capacete e uma camiseta para serem usados no crime. Já Urbano, um suposto funcionário de Maurício Sampaio, teria a função de arrumar dois celulares para ele e o atirador se comunicarem no local do crime.
O assassino, segundo a polícia, seria Ademá Figuerêdo, que, no dia da execução, saiu de um condomínio próximo e seguiu até onde estava Marcus Vinicius.
Crime bem planejado, diz promotora
A promotora Renata de Oliveira Marinho Souza acredita que o crime foi “muito bem planejado, inclusive para se criar álibis”.
“Muito importante que o julgamento aconteça, o que o Ministério Público quer é que a sociedade possa viver o final disso”, disse a promotora.
Presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, Natália Mazotte também se pronunciou e falou sobre a importância da liberdade de imprensa.
“Então isso é uma mensagem muito grave para gente enquanto sociedade. Se os jornalistas eles não tem a liberdade, eles não tem o respaldo das autoridades pra conseguir fazer esse trabalho de fazer chegar a informação que a gente precisa até nós a gente fica completamente no escuro”, disse.
O que dizem as defesas
Maurício Sampaio: o advogado disse que ele e o cliente irão no juri. “Entretanto, quero já advertir a todos que nós não vamos comungar, compactuar com mais atrocidades, de violações da Constituição Federal nos direitos de defesa do meu gabinete”, disse.
Urbano, Ademá e Djalma: o advogado Thales Jayme disse que acredita que provará a inocência deles.
Marcus Vinícius: o advogado disse ao Fantástico que o cliente não tem participação de nada, não cometeu crime algum, não guardou moto, arma, nada.
Em nota, o Atlético Goianiense disse que não vai se manifestar sobre o julgamento.
Julgamento
O juiz Lourival Machado vai presidir o julgamento, que deve contar com 30 testemunhas e pode durar três dias. O julgamento foi adiado pela primeira vez em junho de 2020, quando foi marcado pelo juiz Lourival Machado, mas desmarcado por causa da pandemia do coronavírus.
Depois, o magistrado remarcou o júri para 14 de março deste ano. Ele não aconteceu porque o advogado de Maurício Sampaio deixou a defesa em cima da hora.
O terceiro adiamento aconteceu em 2 de maio deste ano. Desta vez, os advogados de Maurício Sampaio abandonaram o plenário alegando que o juiz Lourival Machado não era imparcial para presidir a sessão.
Valério Luiz Filho
vai participar do julgamento como advogado. Ele será assistente de acusação da promotoria e vai ficar frente a frente com os acusados de planejar e matar o pai dele. Ele disse que espera ter calma suficiente, pois precisa “mostrar” aos jurados o que de fato aconteceu.
“A medida que o tempo vai passando, isso só se agrava, porque é muito ruim pensar em como ele se foi. É também muito ruim pensado que poderia ter sido e não foi. Por causa deles. Coisas importantes na sua vida vão acontecendo, que você gostaria que ele tivesse aqui para compartilhar e nunca vai estar”, desabafou o filho.
By: Maurício Ferraz e Danielle Oliveira, TV Globo e g1 Goiás
Valério Luiz de Oliveira morreu aos 49 anos, em Goiânia, Goiás — Foto: Reprodução/ TV Anhanguera[/caption]
Valério Luiz é morto a tiros após sair da rádio em que trabalhava, em Goiânia, Goiás — Foto: Reprodução/ TV Anhanguera[/caption]
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Maurício Sampaio chegando ao TJ-GO acompanhado de advogado, em Goiânia, Goiás — Foto: Reprodução/TV Anhanguera[/caption]
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Valério Luiz Filho no carro com o pai em Goiânia, Goiás — Foto: Valério Filho/Arquivo Pessoal[/caption]



