ESPECIAL : Lava Jato

Cerco aos hackers.

A PF segue no encalço dos criminosos que violaram as conversas mantidas

Entre o ex-juiz Sergio Moro e integrantes da Lava Jato. Pistas estão sendo seguidas no Brasil e no exterior, e os policiais acreditam estarem próximos de alcançar os cabeças do grupo.

Desde que o site The Intercept Brasil revelou as trocas de mensagens privadas entre o ministro da Justiça, Sergio Moro, e os procuradores da Lava Jato em Curitiba, o Brasil acompanha apreensivo à divulgação, em doses homeopáticas, do teor das interceptações – fruto da violação de celulares de
autoridades brasileiras.

O constrangimento ao qual foram expostos os integrantes da Lava Jato e o ex-juiz que se tornou símbolo do combate à corrupção no País pode mudar de lado. A Polícia Federal planeja-se para, nas próximas semanas, tentar emitir uma contundente resposta ao que classifica de ação
orquestrada perpetrada por criminosos de alto calibre. Sob a coordenação do diretor-geral Maurício Valeixo, a PF acredita ter se aproximado dos hackers que invadiram a privacidade dos procuradores e expuseram as vísceras da Lava Jato.

Em investigações preliminares, os agentes da Polícia Federal já identificaram conexões no Brasil, em especial em Santa Catarina, e no exterior, com o suposto envolvimento de agentes na Rússia e até em Dubai, nos Emirados Árabes.

Segundo agentes ouvidos por ISTOÉ, a PF pode estar perto de alcançar os responsáveis pelo hackeamento ilegal, o que, se confirmado,
constituiria uma bomba capaz de provocar uma reviravolta no caso.

“Há um movimento claro para anular condenações e impedir investigações”

“Um grupo organizado se valeu de métodos criminais para a quebra do sigilo de autoridades” Sergio Moro, ministro da Justiça

As pistas da principal linha de investigação levam à Rússia.

É onde reside o americano Edward Snowden, notório aliado do jornalista Glenn Greenwald, dono do site The Intercept Brasil. Em 2013, Snowden se aproximou dos irmãos bilionários Nikolai e Pavel Durov, que criaram o Telegram, um sistema de comunicação por mensagens similar ao Whatsapp.

A PF suspeita que Snowden possa estar por trás do esquema de bisbilhotagem e divulgação das mensagens de membros do Ministério Público Federal.

Recentemente, Snowden elogiou o Telegram por sua resiliência na Rússia, depois que o governo proibiu o aplicativo e pressionou para que liberasse o acesso às mensagens privadas dos usuários. Na PF, há quem acredite que o americano refugiado na Rússia possa ter se valido de recentes contatos com os Durov para ter acesso aos diálogos envolvendo as autoridades brasileiras.

Condinome: “lucky12345”

A partir da investigação sobre os passos de Snowden, informantes do Brasil na Rússia puxaram um outro fio do novelo: o que leva a Evgeniy Mikhailovich Bogachev, de 33 anos.

Criador do vírus Cryptolocker e do ardiloso código Zeus, ele é procurado pelo FBI americano por crimes cibernéticos. Um rastreamento identificou que Slavic ou “lucky12345”, como é conhecido, teria recebido US$ 308 mil em bitcoins (a moeda virtual). Resta saber se o depósito foi realmente a contrapartida financeira por ele ter participado do processo de quebra do sigilo telefônico dos procuradores.

O dinheiro teria circulado pelo Panamá antes de chegar a Anapa, na Rússia, onde foi transformado em rublos.

Na última semana, o nome do agente russo veio à tona pela primeira vez através de um perfil anônimo no twitter.

Embora parecesse inverossímil num primeiro momento, por conter erros de grafia e tradução, ISTOÉ confirmou que a PF segue sim o rastro da pista, considerada importante pelos agentes hoje à frente do caso.

Em especial, pelos indícios de que Slavic, uma espécie de laranja no esquema, possa estar ligado a Snowden. Um relatório de segurança da Ucrânia aponta que “lucky12345” atua sob a supervisão de uma unidade da espionagem russa.

Mas por que os bilionários irmãos Nikolai e Pavel Durov, do Telegram, se aliariam a Snowden e Slavic na tentativa de desqualificar a principal operação de combate à corrupção da história recente do Brasil?

Agentes da PF colheram informações que os levam a crer que os Durov, atualmente abrigados em Dubai, podem ter agido com motivações puramente ideológicas.

Adeptos do islã, eles teriam ficado enfurecidos com a proverbial predileção do presidente Jair Bolsonaro por Israel em detrimento aos árabes.

Em abril, depois de recebido com honras pelo premiê Benjamin Netanyahu, o presidente anunciou a criação de um escritório de negócios em Jerusalém “para a promoção de comércio, investimentos e intercâmbio” bilaterais.

Netanyahu saudou a abertura de um gabinete brasileiro na cidade e pediu que aquele fosse o primeiro passo para a abertura da embaixada brasileira em Jerusalém – o que provocou a ira dos islâmicos e, consequentemente, dos Durov. Bolsonaro, ao alcançar o poder, foi o principal beneficiário da Lava Jato, conduzida por Moro.

Desmoralizar o juiz e a Lava Jato significaria enfraquecer o bolsonarismo e trazer a esquerda lulista de volta ao jogo. Confirmada a tese, Greenwald teria sido a ponta final da operação comandada pelo trio Snowden, Slavic e Durov.

Não custa lembrar que Greenwald e Snowden foram parceiros num trabalho desenvolvido em 2013 e que expôs dados secretos da Agência de Segurança Nacional (NSA), do governo dos EUA.

O material interceptado por Snowden, também de forma ilegal, foi divulgado por Greenwald no jornal inglês The Guardian e em outros jornais pelo mundo afora, como O Globo, no Brasil. Graças aos documentos vazados, o jornalista ganhou os prêmios Pulitzer e Esso.

Pressionado a divulgar detalhes de sua operação, Snowden acabou se asilando na Rússia, onde passou a ser protegido pelo presidente Vladimir Putin. Enquanto que Greenwald se refugiou no Brasil, casando-se com o brasileiro David Miranda, atual deputado federal pelo PSOL e acabou fixando residência no Rio de Janeiro, de onde opera o The Intercept Brasil.

Atualmente, Snowden é presidente da Freedom of the Press Foundation. Um dos co-fundadores é Greenwald. Na última semana, a PF considerou realizar uma operação de busca e apreensão dos computadores do dono do The Intercept e conduzi-lo para prestar depoimento, mas fontes ligadas ao ministro entenderam que esse fato poderia transformar o jornalista em mártir e o governo ainda corria o risco de ser acusado de cercear a liberdade de imprensa.

Trabalho de profissional

Algo é certo: a PF já sabe que o acesso ilegal ao aplicativo Telegram dos procuradores não foi realizado por amadores.

“Não foi uma ação de um adolescente por trás de um computador. Tratou-se de um trabalho feito por uma organização criminosa altamente especializada”, endossou Moro em depoimento que prestou no Senado na quarta-feira 19.

De fato, segundo fontes da PF, o trabalho de hackers na quebra de sigilo de celulares e computadores foi coisa de profissional. Além de envolver equipamentos caríssimos que alcançam a casa dos milhões de dólares, fogem completamente do padrão de hackers de menor poder destrutivo, conhecidos como “defacements”, que se notabilizaram por fazer as chamadas “pichações políticas” em sites e organizar malfadados ataques a transações bancárias.

No dia 4, o suposto hacker tentou se passar pelo ministro da Justiça enviando uma mensagem a um funcionário do gabinete de Moro, depois de ativar uma conta no Telegram.

Sem descartar as pistas que surgem pelo caminho, na última semana, a PF adicionou uma organização criminosa que operava em Santa Catarina ao rol dos suspeitos.

Na terça-feira 18, a PF desencadeou a operação “Chabu” (vulgo “deu errado”) em Florianópolis, com o cumprimento de sete mandados de prisão e 23 de busca e apreensão.

O objetivo foi a desarticulação de uma quadrilha que vinha quebrando sigilos de autoridades no estado para o vazamento de operações policiais e ações de órgãos públicos.

Para a PF, a quadrilha pode estar envolvida na operação de hackeamento dos celulares dos procuradores do Paraná.

Para a PF, Nikolai e Pavel Durov, do Telegram, teriam se aliado a Snowden, Slavic e Greenwald por razões ideológicas

Entre os presos, está o delegado da PF Fernando Amaro de Moraes Caieron e o policial rodoviário federal Marcelo Roberto Paiva Winter, ambos especializados em crimes cibernéticos e tráfico de drogas.

Foram presos ainda o prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro (sem partido), e o ex-chefe da Casa Civil Luciano Veloso Lima.

Todos eles utilizavam a estrutura da empresa Nexxera, de tecnologia, para cometer as ilegalidades.

Segundo fontes ligadas ao diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, a análise dos documentos apreendidos será decisiva para apontar a existência do elo do grupo com os hackers da Lava Jato.

Assim como a conexão Brasil-Rússia-Dubai, o elucidamento do caso parece estar próximo.

Quem acompanha as investigações assegura: se os indícios encontrados até agora se confirmarem, a PF estará bem perto mudar o rumo do rumoroso episódio que monopolizou as atenções dos brasileiros nas últimas semanas.

[caption id="attachment_69030" align="alignnone" width="1024"] Cerco aos hackers. A PF segue no encalço dos criminosos que violaram as conversas mantidas entre o ex-juiz Sergio Moro e integrantes da Lava Jato. Pistas estão sendo seguidas no Brasil e no exterior, e os policiais acreditam estarem próximos de alcançar os cabeças do grupo. Isto È[/caption]
[caption id="attachment_69031" align="alignnone" width="1024"] NA NUVEM O ministro Sergio Moro saiu-se bem na sabatina do Senado na quarta-feira 19. Deltan Dallagnol (ao lado) comemorou (Crédito:Divulgação)[/caption] [caption id="attachment_69032" align="alignnone" width="1024"] O DESIGNADO O delegado Maurício Valeixo, diretor-geral da PF, está à frente da operação destinada a encontrar os responsáveis pela violação das conversas (Crédito:Divulgação)[/caption] [caption id="attachment_69033" align="alignnone" width="1024"] “Não foi uma ação de um adolescente por trás de um computador. Tratou-se de um trabalho feito por uma organização criminosa altamente especializada”, endossou Moro em depoimento que prestou no Senado na quarta-feira 19. Infográfico ISTOÉ[/caption] [caption id="attachment_69035" align="alignnone" width="1024"] Algo é certo: a PF já sabe que o acesso ilegal ao aplicativo Telegram dos procuradores não foi realizado por amadores. ISTOÉ[/caption]
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  • Gildo Ribeiro

    Gildo Ribeiro é editor do Grupo 7 de Comunicação, liderado pelo Portal 7 Minutos, uma plataforma de notícias online.

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