Chegando a hora
Bolsonaro não aceita recusa dos jogadores
Presidente se irrita com a possibilidade de a equipe principal e o técnico Tite se negarem a disputar a competição continental, cuja realização no Brasil vem sendo criticada.
Diante da possibilidade de os jogadores da seleção brasileira e o técnico Tite se recusarem
a participar da Copa América, cujo início está marcado para 13 de junho, o presidente Jair
Bolsonaro enfrenta mais um desgaste, agora, vindo de dentro das “quatro linhas”.
O Palácio
do Planalto está irritado e preocupado com a eventual recusa de a equipe principal
participar da competição, que veio parar no Brasil depois que Colômbia e Argentina se
recusaram a sediá-la.
Por conta da iminência de um vexame, o presidente já avisou que o
assunto virou “questão de honra” e fez chegar à Confederação Brasileira de Futebol (CBF) a
determinação de fazer com que a Seleção dispute o torneio com força total.
O sinal de alerta soou no Planalto na última sexta-feira: em entrevista à Rede Globo, após
o jogo contra o Equador, pelas eliminatórias da Copa de 2022, o capitão da seleção, o
volante Casimiro, afirmou que haveria uma posição pública do elenco na próxima terça-feira,
mas que o posicionamento “é claro”.
Isso sinalizaria a contrariedade pela realização da
Copa América no país.
“Não sou eu, não são os jogadores da Europa. Quando fala alguém, falam
todos os jogadores, com o Tite, com a comissão técnica. Tem que ser unânime, todos juntos”,
disse.
Desde que anunciou a vinda do torneio para o país, apesar dos 472.531 mortos pela covid-19
— segundo os dados de ontem, levantados pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde
(Conass) —, Bolsonaro vem sendo duramente criticado. Mas manteve a decisão e a anunciou ao
lado do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
Reações
A preocupação fica clara quando se observa a reação dos bolsonaristas nas redes sociais.
“ #ForaTite ” ficou entre os assuntos mais comentados no Twitter. Também começaram a atrelar
o técnico ao PT, colocando fotos do tempo em que treinou o Corinthians, ao lado de Luiz
Inácio Lula da Silva — que é corintiano —, para construir a narrativa de que a possível
decisão da Seleção seria política e para atingir Bolsonaro.
Os parlamentares que apoiam o presidente não economizam teorias, críticas ao técnico, à
Seleção e aos jogadores. O deputado federal Coronel Armando (PSL-SC), ex-vice-líder do
governo, atacou os atletas afirmando que estão sendo manipulados por Tite e reforça a ideia
de que se trata de um movimento político.
Para os bolsonaristas, é incoerente não atuar na
Copa América e manter o Campeonato Brasileiro, a Copa do Brasil e os jogos das
Eliminatórias da Copa do Catar no país.
“É um desgaste que, daqui a pouco, passa. Mas esses caras vão ficar marcados”, diz Armando.
Para o parlamentar, se não quiserem jogar, que se troque o técnico e se convoque outros
jogadores.
Deputado da base de apoio ao Palácio do Planalto, Bibo Nunes (PSL-RS) classificou o movime
nto de protesto dos jogadores como “antipatriotismo e irresponsabilidade”.
“Deixa a imagem
do Brasil muito ruim. Imagem de que não há unidade e que há desrespeito à CBF e à
presidência da República. É uma jogada política: querem menosprezar o presidente”, afirmou.
Bibo carregou nas críticas ao técnico da Seleção. “Quem quer desgaste para o governo está
vibrando com isso.
Mas o Tite é o grande culpado.
Eu não quero jogando pelo Brasil jogadores que não são patriotas. É uma vergonha.
O Tite é um esquerdista, mas tem que saber respeitar”, acusou, defendendo que Renato Gaúcho, ex-treinador do Grêmio e que já
manifestou simpatias a Bolsonaro, assuma a Seleção.
Fiel defensora do presidente, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) nega que haja desgaste.
“Quem está com Bolsonaro está com ele, independentemente de qualquer coisa. Bolsonaro não
sofre (com a decisão dos jogadores), quem sofre é o Brasil”, assegurou.
Incoerência
Segundo ela
“os bolsonaristas estão reagindo a uma ação do Tite, das pessoas que são contra
a Copa América, porque é incoerente (devido às outras competições futebolísticas realizadas
no Brasil)”. E salientou: “É bom para a economia, para os brasileiros, para o otimismo. Aí,
vem o pessoal e politiza isso, e diz que não pode fazer a Copa América aqui. Se isso não é
politização, porque não cancelaram os outros campeonatos? A ação partiu deles de politizar,
e a gente está reagindo”.
Cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo, Eduardo Grin
afirmou que o presidente se desgasta com a situação. Lembrou que o movimento bolsonarista
se apropriou do verde amarelo e da camisa da Seleção e, agora, se vê desafiado pelo time.
“A ideia de trazer a Copa América, no imaginário bolsonarista, significaria reiterar esse
discurso nacionalista, do monopólio da representação nacional. Dada à popularidade do
futebol, o fato de a Seleção se negar a jogar tem uma enorme representatividade social e
pode fortalecer os movimentos contrários a Bolsonaro”, observou.
(Colaborou Vicente Nunes)
Dedaços do Planalto no time “canarinho”
A seleção brasileira tem, na sua história, pelo menos dois episódios de interferência que
passaram pelo Palácio do Planalto. No time do tricampeonato de 1970, o presidente Emílio
Médici queria de todo jeito que o atacante Dario fosse convocado — algo que só conseguiu
depois que João Saldanha foi dispensado do cargo de técnico e Zagallo assumiu o comando da
equipe. Já na seleção que foi à Copa da Argentina, em 1978, o capitão do Exército Cláudio
Coutinho substituiu o gaúcho Osvaldo Brandão — e cunhou a frase de que o Brasil foi
“campeão moral”, pois retornou invicto, mas com o 3º lugar.
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recusa-dos-jogadores.html?utm_source=onesignal&utm_medium=push