Dorama coreano muito emocionante
A caminho do céu’ é série delicada, para ser vista sem pressa
A chegada do streaming ao Brasil abriu para o público uma enorme biblioteca.
Cheia de títulos antes remotos, ela oferece programas que, no passado, só os espectadores mais idiossincráticos veriam.
Foi assim com as séries turcas. Agora, isso se repete com produções coreanas, também conhecidas como K-dramas.
A quem quiser se aventurar nesse catálogo amplo, sugiro começar por “A caminho do céu” (na Netflix).
É uma ficção encantadora, inspirada no ensaio do escritor e “limpador de traumas” (já explico do que se trata) Kim Sae-byul, “Things left behind”.
O protagonista, Geu Ru (Tang Joon-Sang), de 20 anos, tem síndrome de Asperger.
Ele possui uma memória prodigiosa e grande capacidade de organização.
Vive com o pai num apartamento que herdou da mãe. Os dois trabalham desfazendo o quarto e recolhendo os pertences de quem morreu. É uma atividade meticulosa, chamada na Ásia de “limpeza de traumas”.
A história de vida que essas pessoas deixam para trás vai sendo recomposta durante a arrumação.
Anotações, fotografias e recibos bancários dão pistas daquelas existências. Pai e filho seguem uma liturgia.
Antes de começar, eles se desculpam e pedem licença.
Desempenham sua tarefa com reverência e delicadeza. No fim, entregam os achados em caixas aos familiares do falecido.
A dramaturgia se desenvolve em duas camadas: há os acontecimentos na vida de Geu Ru e também essas “exumações biográficas” de quem já não está aqui para contar sua história.
Já nos primeiros capítulos, o pai do protagonista morre.
O rapaz passa a viver com o tutor, um tio, Sang Gu (Lee Je-hoon), que acaba de sair da prisão. É, a princípio, uma figura negativa, que se instala no apartamento de olho numa chance de se dar bem financeiramente. Eles se antagonizam. Geu Ru precisa de ordem. Sang Gu fuma, faz bagunça e fura as barreiras da cerimônia da boa convivência.
Mas “A caminho do céu” não é tão simplista.
A intimidade entre esses opostos também vai abrindo uma oportunidade de rever conceitos. Tio e sobrinho criam laços e aprendem um com o outro.
São dez capítulos que merecem ser vistos sem pressa, longe da dinâmica do binge watching. A ideia aqui é dar um gole de cada vez, para sorver as diferenças culturais imensas entre nós e a Coreia do Sul. A digestão do luto, as relações de afeto e amizade e as regras sociais no Oriente estão no centro dessa trama.
Para o espectador brasileiro, há muito a ser descoberto.
“A caminho do céu” é um jeito de conhecer um pouco sobre um lugar tão distante.
Depois dela, há um mundo de outros títulos para explorar.
Vale a pena.
Por: PATRÍCIA KOGU