À beira de uma ravina íngreme e coberta de neve ao norte do Parque Nacional de Yellowstone, Alec Baldwin e a equipe do faroeste Rust faziam a reunião matinal de segurança das filmagens, retomadas um ano e meio depois de sua interrupção decorrente de uma tragédia. Era tudo menos rotina. “Eu já disse e vou repetir: não tem armas no set, nada que dispare. Existem vários fac-símiles de armas, de borracha a réplicas”, garantiu Gerard DiNardi, o novo primeiro assistente de direção.

O novo armeiro do filme, Andrew Wert, que lida com todas as armas e munições no set, acrescentou que até as munições fictícias (os cartuchos inertes usados em filmes para parecer munição de verdade) eram feitas de borracha e madeira e pintadas de dourado.

E, com essas garantias, as filmagens recomeçaram. Há 18 meses, no Novo México, a equipe estava fazendo um close-up de Baldwin sacando um revólver antigo quando a arma atirou de repente, disparando uma bala verdadeira que matou a diretora de fotografia do filme, Halyna Hutchins, de 42 anos, feriu o diretor, Joel Souza, e traumatizou o elenco e a equipe, dando origem a processos e acusações criminais.

Cerca de 200 membros do elenco e da equipe estão agora trabalhando para terminar Rust. Nem todos voltaram: a armeira original do filme, Hannah Gutierrez-Reed, está enfrentando acusações de homicídio culposo relacionado à morte de Hutchins, e o primeiro assistente de direção original, Dave Halls, não contestou a acusação de manuseio negligente de uma arma. A diretora de fotografia Bianca Cline entrou em cena para terminar o filme que Hutchins começou.

Muitos estão descrevendo Rust como um tributo a Hutchins; seu marido agora é produtor executivo do filme, e ele deu seu apoio a dois cineastas que estão fazendo um documentário sobre a vida dela e a conclusão do filme.

Mas Souza, que foi ferido no tiroteio quando a bala passou por Hutchins e o atingiu em um dos ombros, estava de volta à cadeira do diretor. E Baldwin, à função de protagonista; os promotores do Novo México rejeitaram as acusações de homicídio culposo contra ele, após novas provas de que a arma que ele estava usando, que não deveria conter munição real, tinha sido modificada. Mas um ar de incerteza pairava sobre o astro: os promotores afirmaram que continuariam a investigar o caso e que se reservavam o direito de refazer as acusações contra ele.

Enquanto a equipe se reunia para retomar as filmagens, Souza, que trabalhou pela primeira vez com Baldwin em um esboço do roteiro há cerca de cinco anos, fez um discurso emocionado: “Houve dias em que eu sinceramente não sabia como ia sair da cama de manhã, e vocês foram a razão pela qual consegui. Devemos trabalhar com alegria, como Halyna fazia. Sei que ela estaria ansiosa para que começássemos a trabalhar; portanto, por que não fazemos isso? Hoje estamos trabalhando em um filme. Vamos fazê-lo o melhor possível.”

Todos os olhares voltados para ‘Rust’

Não fazia muito tempo que Baldwin estava de volta ao figurino de Harland Rust, um fora da lei grisalho de chapéu de caubói, casacão marrom e botas de couro de cano alto, quando se viu em uma cena centrada em uma arma. “Quem diabos é você, senhor?”, Patrick Scott McDermott, um jovem ator, grita, antes de pegar o próprio rifle de Rust e apontá-lo para ele.

Toda vez que o armeiro, Wert, traz uma arma para o set, ele declara que se trata de uma réplica, incapaz de disparar um tiro. Ex-soldado de infantaria do exército dos EUA, ele construiu os rifles a partir de peças individuais para que parecessem reais tanto quanto possível, mas não fossem capazes de disparar em nenhuma circunstância. Inutilizou os pinos de disparo e modificou os cilindros para que não coubesse nenhuma munição neles.

As balas de borracha e madeira foram pintadas de dourado para que parecessem verdadeiras quando enfiadas na bandoleira de Baldwin. “Eu queria que não houvesse nenhuma dúvida quanto à origem das armas ou de qualquer outra coisa”, afirmou Wert, cuja carreira profissional com armas em sets de filmagem tem mais de 20 anos e inclui Clube de Compras Dallas e O Duelo, faroeste de 2016 estrelado por Woody Harrelson.

A questão dos armeiros e da segurança das armas nos sets está no centro das investigações sobre como “Rust” se tornou mortal. Os promotores culparam a armeira original, Gutierrez-Reed, por ter permitido munição real em um set de filmagem, o que deveria ser proibido, e por não ter verificado completamente o revólver que foi entregue a Baldwin no dia do disparo.

Foram levantadas questões sobre como ela e Halls, o primeiro assistente de direção original, lidavam com protocolos de armas. Gutierrez-Reed, cujo advogado disse que ela pretende se declarar inocente, afirmou aos investigadores que tinha verificado toda a munição, mas reconheceu que gostaria de ter feito isso mais minuciosamente.

No set de Montana, Wert recolheu os rifles dos atores entre as cenas, colocando-os de lado, para mais tarde guardá-los em uma caixa trancada com uma senha.