Diminui e cresceu muito
Como esta empresa de café fechou mais de 50 franquias e ainda assim aumentou o faturamento?
Cafeteria Grão Espresso fechou unidades, mas conseguiu faturar mais, o que surpreende de início; especialista diz que estratégia pode ser usada por grandes empresas
Imagine uma operação com 202 unidades, todas franqueadas, e um faturamento de R$ 70 milhões em um único ano.
Seria uma realidade de aparente sucesso. Porém, não eram todas as unidades que performavam bem.
E não apenas isso.
As gestões entre as franquias e a franqueadora não eram eficientes em termos de integração.
Todo este contexto fez com que a cafeteria Grão Espresso passasse por uma reformulação interna e aumentasse o faturamento mesmo encerrando mais de 50 operações.
Ela faturou R$ 70 milhões em 2022, reduziu seu tamanho de 202 para 150 franquias, e o faturamento aumentou para R$ 88 milhões (mais de 25%) em um ano.
Mas como isso aconteceu?
Por que fechar lojas pode aumentar a receita e quais os direitos de franqueados que tiveram as unidades encerradas?
Confira a seguir.
A pandemia teve papel chave neste processo.
Inaugurada há pouco mais de 30 anos, em 1992, com a primeira franquia da rede datando de 1995, já existiam muitos contratos defasados em relação às novas práticas da marca.
Além disso, com a chegada do lockdown, muitos locais permaneceram por muito tempo fechados e parte dos franqueados não conseguiu se recuperar 100% do baque financeiro com linhas de crédito, por exemplo.
Fora que alguns locais deixaram de ser vantajosos, como foram o caso de universidades,
que passaram a adotar cada vez mais os modelos híbrido ou EAD, conforme explica o diretor de operações da Grão Espresso, Ricardo Vargas.
Arrisco a dizer que 90% dos fechamentos foram em consenso entre as partes.
A maior parte, inclusive, em universidades.
Além disso, outras 28 unidades nós entendemos que fazia sentido continuar no portfólio, mas com troca de gestão, seja por desgaste ou cansaço do franqueado, seja por um problema com a administração”, explica o executivo.
Segundo ele, as outras operações que não foram em comum acordo ainda estão em negociação. Porém, nenhum processo foi judicializado.
Por mais que possa parecer contraintuitivo, o consultor de negócios do Sebrae-SP Artur Shoiti Takesawa afirma que fechar unidades para retomar receitas é um processo muito comum para grandes empresas.
É o famoso recuar para crescer. Isso pode acontecer por inúmeros motivos, seja por baixo resultado por parte de uma unidade,
seja para melhorar a logística da marca ou até mesmo ter mais recursos para reinvestir em lojas que dão mais certo.
É mais raro em pequenos negócios ver esse tipo de movimento, mas, para médias e grandes empresas, é uma tática recorrente, comenta.
Ao todo, o grupo saiu de 202 unidades para, atualmente, 150.
Só que este processo de aumentar a receita não foi feito apenas fechando unidades.
Uma padronização de sistemas entre as franquias, com a introdução de nova plataforma de tecnologia na operação como um todo, foi realizada em paralelo.
Isso fez com que, além de um controle de gestão e de estoque mais eficiente, todos os pormenores fossem mais bem percebidos.
“A marca não tinha um sistema de PDV (ponto de vendas) único e, para traçar linhas de ações, precisávamos ter isso padronizado.
Não conseguia ver, por exemplo, qual produto tinha mais saída e o quanto”, ressalta Vargas.
Foi por conta desta demanda que, em parceria com uma empresa de tecnologia, desenvolveram um sistema integrado para todos os franqueados.
O escolhido para tal foi a Linx, empresa do Grupo StoneCo – das maquininhas de pagamento verdes.
Quando a franqueadora não tem uma visão do que está acontecendo em tempo real, pode ter franqueados com dificuldade financeira por uma falha de gestão, por exemplo, mas não fica sabendo.
Os produtos da ponta podem não estar de acordo com a marca.
E isso vai ajudar a ver também como e quais promoções podem ser eficientes e em quais contextos, quais produtos vendem mais etc.,
declara Bruno Primati, diretor do segmento de bares e restaurantes da Linx.
Takesawa, do Sebrae-SP, reforça que, além de maior eficiência, uma padronização de sistema faz com que a marca saiba e possa se prevenir de eventuais tentativas de fraude por parte de unidades franqueadas.
Às vezes há um contrato de exclusividade de fornecimento de produtos pela marca, mas
infelizmente o franqueado compra de outros fornecedores para gastar menos.
Se não tem tudo ali bem controlado, fica muito difícil de identificar, ressalta.
A estruturação do processo de reformulação da Grão Espresso durou de julho a novembro de 2022, mês em que tudo foi colocado em prática.
O faturamento daquele ano havia sido de R$ 70 milhões. Para 2023, primeiro ano cheio com as transformações, a receita bruta já pulou para R$ 88 milhões, um aumento de mais de 25%.
Até o final deste ano, há a projeção para que mais de 11 unidades sejam abertas e, para o próximo ano, 18 lojas já estão comercializadas.
Direitos do franqueado e do franqueador
Como já explicamos neste material, o mercado de franquias no Brasil é regido pela lei de número 13.966/2019.
Ela detemina direitos e deveres de ambas as partes do negócio – franqueado e franqueador.
E o ponto de partida, de acordo com Takesawa, do Sebrae-SP, é justamente o prazo de contrato.
Nenhuma franqueadora é obrigada a renovar contrato com um franqueado (e vice-versa). ,
Logo, se for da vontade da marca encerrar a parceria, basta não renovar.
Agora, se há o rompimento antes do prazo, há incidência de multa para que o franqueado seja abonado.
E, se não houver acordo, o caminho será a Justiça, resume.
Este processo pode ser mais complexo se houver contratos fechados do franqueado com clientes diretos para períodos mais longos, como dali a dois anos do rompimento entre franqueadora e franqueado.
A marca tem que assumir, conclui.
Por Felipe Siqueira