Análise política
Capitão América contra os ministros do STF
Os juízes brasileiros tentaram durante anos, desde 2019, e enfim conseguiram: se tornaram os vilões de um filme da Marvel

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) tentaram durante anos, desde 2019, e enfim conseguiram: se tornaram os vilões de um filme do Capitão América.
De um lado, o discurso da liberdade de expressão — é saudável desconfiar dele, mas o discurso é esse —; do outro, os censores.
O bilionário Elon Musk deu sinais nos últimos dias de que sua batalha pela liberdade de expressão não é lá muito virtuosa, ao titubear sobre as notas da comunidade do X após mentir junto com Donald Trump sobre o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, mas o fato é que ele está do lado certo na história das redes sociais — e errado na questão da Ucrânia.
O CEO da Tesla voltou a se manifestar, na semana passada, sobre Alexandre de Moraes após passar meses sem falar publicamente sobre o ministro do STF, mais precisamente desde a época em que o X foi desbloqueado no Brasil, após pagar multas milionárias por descumprir ordens do Supremo.
Os vingadores
Musk retornou ao tema cheio de aliados.
O fundador da Amazon, Jeff Bezos, e o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, também se abraçaram ao governo Trump, na expectativa de que suas empresas sejam defendidas no exterior em batalhas judiciais, a maioria delas sobre regulação das redes sociais.
O governo Trump deu um primeiro passo mais claro no conflito, ao dizer por meio de uma agência do Departamento de Estado
que o respeito à soberania é uma via de mão dupla com todos os parceiros dos EUA, incluindo o Brasil.
Bloquear o acesso à informação e impor multas a empresas sediadas nos EUA por se recusarem a censurar indivíduos que lá vivem é incompatível com os valores democráticos,
incluindo a liberdade de expressão, completa a mensagem, distribuída também pela Embaixada americana no Brasil.
Carolina
Além disso, o Comitê Judiciário da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou um projeto de lei que pode impedir Moraes de entrar no país.
Denominada como
No Censors on our Shores Act (Sem Censura em Nossas Costas),
a medida pretende proibir a entrada em território americano de autoridades estrangeiras que
violem os direitos dos americanos garantidos pela Primeira Emenda.
O ministro Flávio Dino, que costumava brincar de Vingadores quando fazia parte (formalmente) do governo Lula, saiu em defesa do colega, dizendo que Moraes pode visitar Carolina, no Maranhão, insinuando que ele não precisaria passar pelos estados americanos da Carolina do Norte ou do Sul para ter boas férias.
Moraes também se defendeu.
Falou em coragem e acabou se enrolando ao distorcer os motivos que levaram à criação da Organização das Nações Unidas (ONU).
Itamaraty
Para piorar, o governo Lula resolveu entrar na história e divulgou uma nota passando um belo de um recibo.
A nota diz que
o governo brasileiro rejeita, com firmeza, qualquer tentativa de politizar decisões judiciais
e ressalta a importância do respeito ao princípio republicano da independência dos poderes, contemplado na Constituição Federal brasileira de 1988.
Mas diz também que
a liberdade de expressão, direito fundamental consagrado no sistema jurídico brasileiro,
deve ser exercida, no Brasil, em consonância com os demais preceitos legais vigentes, sobretudo os de natureza criminal
e que o Estado brasileiro e suas instituições republicanas foram alvo de uma orquestração antidemocrática baseada na desinformação em massa,
divulgada em mídias sociais.
Vilões
Pelo tom, a nota não parece exatamente ter respeitado o “princípio republicano da independência dos poderes“, porque o governo Lula simplesmente reproduziu o discurso de Moraes — que, aliás, teria participado da redação da nota.
O ministro do STF não faz parte do governo Lula (formalmente).
É difícil dizer que há mocinhos nesse tipo de disputa política.
Não se pode ignorar que o governo Trump tem aliados sob investigação do STF, e que o grupo de Jair Bolsonaro não está na mira da Justiça brasileira apenas por alegadamente abusar da liberdade de expressão, mas por tramar um golpe de Estado.
Mas quem levou o assunto para o rumo da censura foi o próprio STF, e antes mesmo de Bolsonaro e seus aliados iniciarem
uma orquestração antidemocrática baseada na desinformação em massa, divulgada em mídias sociais, para usar a descrição do Itamaraty.
A liberdade de expressão é a grande vítima colateral da tentativa do STF de se defender dos críticos, e é muito mais difícil interpretar o papel de mocinho quando se está do lado errado.
Por: Rodolfo Borges
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